Não é a primeira vez que o presidente Bolsonaro se envolve em uma polêmica (aliás, isso é uma constante). Sequer é a primeira vez que ele fala do tratamento do HIV como uma despesa. Mas o discurso vindo do presidente da república é perigoso.
Muita gente afirma que nesses casos é besteira pensar no que ele falou, alegando que Bolsonaro não pode fazer nada para mudar. Além de ingênua, tal afirmação esquece o principal: O discurso sendo oficial (afinal ele é o Chefe de Estado) legitima ações e discursos de outras pessoas. O que é muito perigoso! Vamos aos fatos:
Um dia depois do presidente afirmar que “uma pessoa com HIV, além do problema sério para ela, é uma despesa para todos no Brasil”, veio a público que a Confederação Nacional da Indústria (CNI) entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra uma regra trabalhista que protege pessoas que vivem com HIV e outras doenças estigmatizantes.
Apesar de ter sido protocolada antes da fala de Jair Bolsonaro, ação é mais uma prova que o discurso discriminatório está ganhando espaço em nosso país com a última eleição presidencial. Vale lembrar que em 2015, em entrevista para Monica Iozzi, no programa CQC, o então deputado já afirmava que “não venha querer políticas públicas , dinheiro do povo para tratar essa gente que contrai a doença nesses atos”.
Além de questões práticas, com a ameaça de perda de direitos, a fala de Bolsonaro ainda ajuda a aumentar o preconceito contra as pessoas com HIV. Segundo pesquisa divulgada pelo Programa Conjunto nas Nações Unidas sobre AIDS/HIV, 64% dos entrevistados já sofreram estigma ou descriminação pelo fato de viverem com HIV.
Ao dizer que as pessoas vivendo com HIV causam prejuízo à sociedade, o presidente autoriza o estigma, a discriminação e a violação dos direitos humanos.
Nota da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS
Além do absurdo que é considerar o tratamento de HIV como uma despesa, no sentido pejorativo, vale lembrar que o Brasil tem, aí sim, despesas absurdas com as quais o presidente deveria se preocupar. Levantamento feito pelo jornalistas Leandro Prazeres, da Globo Brasília, em seu twitter mostra que o gasto com remédios do tratamento com HIV em 2019 foi de R$ 1,8 bilhão (dados do Portal da Transparência). Enquanto isso, estima-se que os gastos com pagamento de pensões a filha de militares por ano custe R$ 5 bilhões.